O municipio de Taboão da Serra (SP) registrou 253 casos prováveis de dengue em fevereiro desse ano, de acordo com o Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN) do Sistema Único de Sáude (SUS). O número de casos é 500% maior do que o registrado tanto em janeiro quanto até a segunda semana de março, com 42 e 41 casos, respectivamente.
Os registros superam os da epidemia de dengue de 2015-2016 na cidade no mesmo período, de acordo com os dados analisados com exclusividade pela reportagem da tab_jornalismo.
Na ocasião, Taboão registrou 2,8 mil casos confirmados pelo Centro de Vigilância Epidemiológica “Prof. Alexandre Vranjac” (CVE), orgão da Secretaria de Saúde Estado de São Paulo que também monitora os casos.
Taboão é parte da Zona Metropolitana de São Paulo (ZMSP), que tem vivido uma alta nos casos de Dengue, especialmente na zona norte da região. Só na capital paulistana, ao menos 96 distritos foram considerados epidêmicos pela Secretaria Municipal da Saúde, entre os quais, o Campo Limpo, limítrofe com a cidade.
Em meio à alta de casos, o governo de Tarcísio de Freitas (Republicanos) decretou estado de emergência em São Paulo no último dia 5 de março, depois que o estado atingiu 300 casos por 100 mil habitantes. Em Taboão, essa marca é de 92,4 casos por 100 mil habitantes.
A medida foi tomada depois de análise do Centro de Operações de Emergências (COE), grupo coordenado pela Secretaria Estadual da Saúde que, em 1º de março, realizou campanha de conscientização em parceria com a Prefeitura de Taboão da Serra.
Por que isso é importante?
O aumento significativo de casos de dengue em Taboão da Serra, que quintuplicaram entre janeiro e fevereiro de 2024, reflete uma tendência observada em todo o Brasil. Com 1,6 milhão de casos prováveis da doença e 467 mortes registradas até o dia 13 desse mes, a dengue se tornou uma emergência de saúde pública em diversas regiões do país.
A situação fez com que pelo menos oito unidades da federação decretassem estado de emergência e propusessem ações e medidas de prevenção e controle da doença.
A explosão de casos de dengue também trouxe desafios adicionais para a população, especialmente no que diz respeito à vacinação. Com o aumento, cresce também demanda pela vacina Qdenga (TAK-003), desenvolvida pelo laboratório japonês Takeda Pharma, vista como importante ferramenta de combate à dengue.
O Ministério da Saúde já começou uma campanha de vacinação visando jovens de 10 a 14 anos, que correspondem, segundo à pasta a maior parte das hospitalizações, mas ainda não divulgou calendário ampliado a mais faixa etárias. Agora, quem optou pela iniciativa privada, tem enfrentado dificuldades para completar o ciclo vacinal, devido à escassez e ao aumento dos preços do insumo.
O que dizem os números?
Em número totais, Taboão registrou esse ano 337 casos prováveis, de acordo com o SINAN, 42 em janeiro e 253 em fevereiro. Os números do início do ano também são os maiores para o período desde 2014, o início da atual metodologia utilizada no sistema.
Fevereiro também foi o mês com o o quarto maior número de casos registrados em um único mês da série histórica, atrás dos meses de março (863), abril (1345) e maio (480) de 2015, auge da epidemia.
Se condiserados os casos por semanas epidemiológicas, a cidade teve, em 2024, o início de ano com maior número de casos próváveis desde a inclusão da metodologia no sistema: foram 54 na 6ª semana, seguidos por outros 32, voltando a subir para 71 na 8ª semana e 88 na 9ª.
Definida internacionalmente e adotada pelo Sistema Único de Saúde, a semana epidemiológica é contada de domingo a sábado a fim de facilitar a análise de doenças e possibilitar o comparativo de dados entre diferentes regiões.
Se considerada a distribuição de gênero, desde janeiro desse ano, as mulheres são a maioria dos casos de dengue na cidade, com 183 notificações (54,3%) registradas no sistema. Desde o início da série, em 2014, a média de mulheres afetadas pela dengue é 58,5% em Taboão.
Outro recorte feito pelo sistema é o de raça: dos 337 casos prováveis da doença registrados em Taboão, 182 eram de pessoas pretas (8%) e pardas (46%), cerca de 5 em cada 10 entre os afetados.
Em um cenário em que Taboão tivesse 100 casos, com a atual distribuição, aproximadamente 46 seriam de pessoas pardas, 30 brancas, 8 pretas e 1 indígena. Além desses, cerca de 15 não teriam a cor da pele registrada no SINAN.
O que estão dizendo?
Especialistas têm olhado para o aumento de casos de dengue com preocupação e tem alertado para possíveis valores recordes nos meses de abril e maio.
Tradicionalmente esses meses têm mais casos da doença, como destacou ao portal Poder360 o infectologista Kléber Luz, que é professor do Departamento de Infectologia da Universidade Estadual Paulista (Unesp) Alexandre Naime e coordena a Sociedade Brasileira de Infectologia(SBI).
“A expectativa é de que teremos números recordes do final de março ao início de abril. Deveremos ter graves problemas nos próximos meses”, afirmou o especialista.
A fala do professor vem ao encontro dos próprios dados históricos disponíveis no SINAN, especialmente em Taboão da Serra. Em 2015, ano de epidemia de dengue, a primeira semana epidemiológica de abril registrou 428 casos na cidade, 228 casos a mais que na última de março daquele ano.
Em artigo no Jornal da UNESP, o biológo Adriano Mondini também destacou que o perfil de cidades que tenham alta densidade populacional pode ser um agravante para o aumento no número de casos.
“A alta densidade populacional e a presença do mosquito transmissor já são dois fatores que podem favorecer a transmissão do vírus da dengue.”
Taboão da Serra é a cidade com maior densidade populacional do país de acordo com o Censo de 2022, concentrando 13,4 mil habitantes por quilômetro quadrado. Só os bairros do Jardim Record e Parque Pinheiros concentrando mais de 15 mil domicílios e aproximadamente 39,6 mil pessoas, conforme apurou a tab_jornalismo a partir dos dados de coordenadas dos endereços divulgados pelo IBGE.
À Agência Senado, o secretário de Saúde de Minas Gerais e presidente do Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Saúde (Conass), Fabio Baccheretti destacou o papel coletivo do combate, com atuação da própria população.
“Mesmo que uma pessoa faça o dever de casa e elimine os criadouros, ela ainda poderá pegar dengue, porque o mosquito consegue voar por cerca de um quarteirão. A negligência de uma pessoa pode afetar todas as que estão ao redor. É preciso que o pensamento seja coletivo”, afirmou o secretário no mês passado.
Já o sanitarista Jonas Brant, coordenador da Sala de Situação de Saúde da Universidade de Brasília (UnB), também falou à Agência Senado, apontou para a responsabilidade do poder público no combate à doença.
“O governo, seja ele federal, estadual ou municipal, é o ator que deve organizar estratégias e coordenar os esforços da sociedade para resolver o problema” disse o especialista.
Brant também comentou sobre as campanhas educativas tem falhado, principalmente por serem muito genéricas.
“Não podemos continuar usando as mesmas estratégias de comunicação de 20 ou 30 anos atrás. Já está claro que a linguagem adotada é frágil e não consegue engajamento. As peças publicitárias são genéricas, não são específicas para a realidade de cada comunidade”, afirmou.
O especialista reforça a necessidade de uma comunicação mais próxima da realidade da população.
“Não adianta falar sobre água em pneu numa região onde só existe prédio e ninguém tem pneu ao ar livre. Não adianta falar sobre vaso de planta num lugar onde o problema é o lixo que se acumula na rua ou em terreno baldio”, continua Brant.
A gestão de José Aprígio (Podemos) realizou em 1º de março uma ação conjunta com a Secretaria de Saúde do Estado para orientação aos munícipes, distribuição de material explicativo e busca de possíveis focos do mosquito nos domicílios da cidade.
A reportagem da tab_jornalismo tentou contato com a Prefeitura de Taboão da Serra para saber das medidas tomadas pelo poder público no combate da dengue, além da ação com o Estado.
Também perguntamos se há algum plano da Secretaria de Saúde para ampliar a capacidade de atendimento nos postos de saúde da cidade, além de questionar se há alguma estratégia de comunicação da Prefeitura para conscientização da população. A Prefeitura não respondeu às perguntas da reportagem. O convite continua aberto.
Saiba mais
A dengue é uma doença viral transmitida pela picada do mosquito Aedes aegypti infectado. Os sintomas da dengue incluem:
- Febre alta
- Dores musculares intensas
- Dor de cabeça
- Dor atrás dos olhos
- Fadiga
- Náuseas e vômitos
- Manchas vermelhas na pele.
Em casos mais graves, pode ocorrer sangramento de mucosas, como gengivas e nariz. Caso apresente um ou mais desses sintomas, é fundamental buscar imediatamente a unidade básica de saúde mais próxima.