Taboão da Serra teve queda no número de leitos totais do Sistema Único de Saúde (SUS) nos últimos 4 anos, de 389 leitos no incío 2019, para 354 ao fim de 2022, de acordo com dados da Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo, obtidos via Lei de Acesso à Informação (LAI) pela reportagem da tab_jornalismo.
O levantamento revela as oscilações no número de leitos ao longo desse período, além de apontar que a cidade encerrou o ano de 2022 com o menor número de leitos registrado até então.
O debate em torno da questão da saúde na cidade se intensificou depois que Iris Meireles da Silva, de 28 anos, morreu vítima de um infarto, na cidade.
De acordo com a família, a morte da jovem teria ocorrido em decorrência à negligência médica durante o atendimento na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) Dr. Akira Tada. A prefeitura indicou, em nota, a abertura de sindicância para investigar o caso.
Por que isso é importante?
Os dados a que a reportagem teve acesso trazem um panorama da capacidade de atendimento à população de Taboão da Serra que, segundo último Censo 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), já conta com mais de 270 mil habitantes.
Atualmente, Taboão é a cidade mais densamente povoada do país, já que o aumento da população pode pressionar a capacidade de atendimento das unidades da cidade.
O município tem pelo menos duas obras em saúde paradas: uma é Unidade Básica de Saúde (UBS) Parque Laguna, que está envolvida em uma disputa judicial entre a Prefeitura e a empreitera do Projeto. O Centro de Especialidades Maria José de Albuquerque, no Parque Assunção, onde será construída a nova sede, também está parado há mais de 3 anos.
Além dos problemas relacionados à infraestrutura, a diminuição no total de leitos ocorreu em um momento de aumento populacional.
As regiões do Jardim Record, Jardim Trianon, Jardim Freitas, por exemplo, concentravam, até 2010, o maior número de pessoas com alguma dificuldade para caminhar ou subir degraus, cerca de 1,4 mil pessoas. À época, Jardim Saporito, Jardim Clementino e Jardim Iracema, que somavam pouco mais de 1,1 mil pessoas.
A comorbidade é uma das que afetam essas regiões, em geral, com menor concentração de renda e mais depententes do atendimento público de Saúde.
Com os novos dados do Censo 2022, que já apontou aumento da população de Taboão da Serra, o cenário se torna ainda mais delicado.
Em 2022, cientistas das universidades de Edinburgh Napier e University of the West of Scotland conduziram um estudo no Reino Unido, examinando regiões densamente povoadas e suas taxas de doenças.
Publicado no International Journal of Environmental Research and Public Health, o estudo analisou associações entre alta densidade populacional e maiores taxas de doenças crônicas não transmissíveis, como câncer, doenças cardiovasculares, DPOC, bem como aumento da incidência de asma e pé torto.
Nesse contexto, a redução da capacidade de atendimento e dos leitos teria impactos significativos. Isso afetaria não apenas a assistência médica disponível, mas também a habilidade da cidade em lidar com situações de crise na área da saúde, semelhantes às observadas durante a pandemia de Covid-19.
Contexto Geral
A estrutura de saúde da cidade já havia sido alvo de críticas dentro do mundo político, mas direcionada ao Hospital-Geral do Pirajussara (HGP). Junto à a Unidade Mista de Taboão da Serra, conhecido como Pronto-Socorro (PS) Antena e a Unidade de Pronto-Atendimento (UPA) Dr. Akira Tada, o HGP é a uma das unidades de saúde do município.
A estrutura do HGP possui 282 leitos, incluindo UTIs para adultos, neonatal e pediátrica, além de uma Maternidade de Alto Risco e Ambulatório de Especialidades Médicas. A unidade é considerada referência para outros oito municípios da região, o que tem impactado na capacidade de atendimento e lotação dos leitos.
O vereador Anderson Nóbrega (MDB) expressou insatisfação com a administração do HGP, durante fala no plenário da Câmara no dia 14 de junho.
Ele citou o serviço feito pela Associação Paulista para o Desenvolvimento da Medicina (SPDM) como “fraquíssimo”, e relatou problemas no atendimento aos moradores do município. Entre as queixas apresentadas, Nóbrega apontou que o tomógrafo do local está quebrado.
Já o vereador Ronaldo Onishi (DC) apoiou a fala de Nóbrega e fez um apelo ao Governador Tarcisio de Freitas (Republicanos) para que fossem retomados os atendimentos especializados, como oftalmologia, fisioterapia e dermatologia no local, destacando a urgência na realização de operações de catarata, que não estão mais sendo realizadas no hospital.
Recentemente, a co-deputada estadual Najara Costa (PSOL-SP) postou vídeo em suas redes sociais no qual questionou a administração atual, do prefeito José Aprígio, pelo ocorrido com X na X. Costa destacou a falta de vagas para várias especialidades médicas e demora para conseguir consultas, especialmente com ginecologistas.
O que dizem os números?
Nos dados gerais da Secretaria de Saúde do Estado, Taboão da Serra permaneceu, entre janeiro e novembro de 2019, com 389 leitos SUS. A primeira queda desse período foi de 15 leitos em dezembro no mesmo ano, fechando o saldo de 374 leitos do Sistema Único de Saúde.
Já em 2020, o número também oscilou, com aumento de 15 leitos em janeiro. Quando a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou pandemia de Covid-19, em 11 de março, Taboão da Serra contabilizava a perda de 4 leitos e um saldo de 385 leitos disponíveis naquele mês.
Com a pandemia, um movimento de alta nas hospitalizações devido à doença começou: em 1º de abril, a cidade tinha 22 casos da doença. Cinco dias depois, 41 casos, e na primeira quinzena de abril, 92 casos.
No período, Taboão da Serra ganhou 68 leitos na rede pública em abril, com novo aumento de 30 vagas em maio, com 483 leitos disponíveis na rede SUS, número que se manteve até junho daquele ano.
Em julho, o número de leitos registrou a maior queda do período, 51 leitos, com nova queda em agosto de 10 leitos, atingindo 422 leitos totais SUS. Entre setembro e novembro de 2020, a cidade ganhou 19 vagas, 9 em setembro de 2020 e mais 10 em novembro.
O número que se manteve até março de 2021, quando nova queda de 6 leitos deixou a cidade com 435 leitos SUS.
Em abril de 2021, a cidade teve sua segunda pior queda no período analisado, 37 leitos, restando 398 leitos na cidade, cifra que foi mantida até julho de 2021, quando a cidade ganhou 10 leitos, permanecendo 408 leitos até outubro de 2021.
Entre novembro e dezembro de 2021, ocorreram duas quedas consecutivas, com a perda de 24 e 20 leitos, respectivamente, encerrando o ano de 2021 com um saldo de 364 leitos disponíveis.
Em 2022, a cidade adicionou 15 leitos, 5 em janeiro e 10 e março, totalizando 379 leitos. No entanto, maio e junho registraram quedas de 20 e 5 leitos SUS, respectivamente, deixando a cidade com 354 leitos até o fim de 2022, o menor número até agora já registrado pela Secretaria.
Mais detalhes
Durante o período analisado, Taboão da Serra também apresentou variações no número de leitos por especialidade, de acordo com a Secretaria de Saúde de São Paulo.
Os dados mostram que a cidade manteve os 107 leitos clínicos de janeiro de 2019 até fevereiro de 2020, quando houve queda de 10 leitos, deixando a cidade com saldo de 97 leitos desse tipo. Em abril de do mesmo ano, houve um aumento expressivo de 64 leitos, seguido por mais 30 leitos em maio, totalizando 191 leitos, ambos aumentos foram reflexos da alta no número de casos de Covid-19.
No entanto, a quantidade de leitos clínicos diminuiu em julho, com uma queda de 25 unidades, deixando a cidade com 166 leitos disponíveis.
Até fevereiro de 2021, pequenas flutuações para mais e para menos fizeram a dispobilidade variar. Foi em março de 2021, no entanto, em que ocorreu a maior perda registrada no período: 57 leitos, chegando a um total de 112 leitos clínicos do SUS.
O ritmo de somas inferiores às perdas se manteve até o fim de 2022, puxados pela queda de 25 leitos entre maio e junho, deixando a cidade com o menor número registrado: 88 leitos clínicos.
Os leitos cirúrgicos, por sua vez, permaneceram estáveis em 88 unidades, com uma queda de 5 leitos até dezembro de 2022, totalizando 83 leitos disponíveis. Da mesma forma, os leitos pediátricos apresentaram poucas variações, iniciando com 48 leitos e diminuindo para 33 em junho de 2020, mantendo essa quantidade até o final de 2022.
Já os leitos obstétricos também tiveram um comportamento semelhante, começando com 65 unidades e diminuindo para 60 em julho de 2020, mantendo-se assim até o final do período analisado. Quanto aos leitos de outras especialidades, houve uma redução de 14 para 12 no mesmo período.
Estrutura de saúde da região
A análise dos dados obtidos com exclusividade pela tab_jornalismo junto à Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo e à Fundação SEADE mostra a evolução dos leitos do SUS em Taboão da Serra nos último quatro anos, no período entre janeiro de 2019 e dezembro de 2022.
Comparado aos seus vizinhos, Taboão possui uma infraestrutura maior na área de saúde. A cidade conta com um número maior de clínicas em comparação a Embu das Artes, sendo 47 em Taboão e 14 em Embu.
Além disso, Taboão possui mais unidades de Diagnóstico e Terapia, com seis unidades em comparação às duas do município vizinho. No que diz respeito aos serviços de Pronto Atendimento, Taboão também possui uma vantagem, com duas unidades em comparação à uma em Embu das Artes.
Em relação aos serviços de saúde mental, Taboão possui três Unidades de Saúde Mental, enquanto Embu das Artes tem duas. Além disso, Taboão conta com mais unidades de Vigilância em Saúde, com um total de quatro, enquanto Embu das Artes possui três unidades.
O Embu, no entanto, possui um número maior de Unidades de Consultório Isolados em comparação a Taboão, sendo 95 contra 67, respectivamente. Os Consultórios Isolados, de acordo com definição do Ministério da Saúde, são salas destinadas à prestação de assistência médica, odontológica ou de outros profissionais de saúde de nível superior, ou seja, são locais próprios para atendimento médico.
De acordo com os dados do SEADE, em 2022, Taboão da Serra contava 230 enfermeiros e 355 médicos na rede SUS. Em média, a cidade tem 0,93 enfermeiro por habitante. Quanto aos médicos, são 1,67 médicos.
Em termos de saúde básica, a cidade conta com 139 clínicos-gerais, 76 pediatras, 39 médicos residentes, 14 médicos de ginecologia obstétrica, 9 anestesionoligistas e 9 médicos para cirurgia Geral, além de outras especialidades.
O que estão dizendo?
Durante a 19ª Sessão Ordinária da Câmara de Vereadores de Taboão, do dia 20 de junho desse ano, o vereador Anderson Nóbrega (MDB) relatou problemas no no tomógrafo do HGP.
“O tomógrafo do HGP, que é da empresa da SPDM, está quebrado há dias, há semanas, e está dando muito trabalho ao nosso serviço de saúde[…].” disse durante sua fala na tribuna.
O vereador também mencionou problemas que estariam sendo causados devido a problemas de contrato entre o Estado e a empresa.
“[…] o Hospital Geral, está impedindo, está negando vagas para os nossos munícipes por causa de birra, porque perdeu o contrato na cidade, uma empresa que fazia um serviço fraquíssimo, está com o tomógrafo quebrado e está dificultando o trabalho da ambulância do pessoal que trabalham na remoção dos pacientes da nossa cidade”, completou.
A fala foi seguida pelo vereador Ronaldo Onishi (DC), que apontou para a retirada de especialidades que, segundo o vereador, foram feitas ainda na gestão do governador Rodrigo Garcia (PSDB):
“[Queria] fazer um apelo para o governador Tarciso de Freitas, para que retorne as especialidades que foi tirada no governo anterior […], a oftalmologia, a fisioterapia e a dermatologia, e também, governador, que retorne as operações de catarata.” afirmou Onishi.
Já a co-deputada Najara Costa (PSOL) comentou sobre os problemas na UPA Akira Tada e no PS Antena em um vídeo publicado em seu perfil do Instagram:
“A gente enfrenta um grande caos na saúde do nosso município e infelizmente isso não é de hoje. Isso acontece por conta do coronelismo político, por conta de não darem grande importância que se tem para a saúde da nossa população, especialmente a população mais pobre.” disse em vídeo a co-deputada.
Costa lembrou que, quando o pai da co-deputada faleceu, dentro das instalações da unidade do PS Antena, sua morte só foi comunicada com horas de atraso, quando o corpo já estava no necrotério.
Na sexta-feira (1), uma junta de vereadores e autoridades composta por Anderson Nóbrega (MDB), Alex Bodinho (PL), Manoel Nezito (Republicanos), Sandro Ayres (PTB), Enfermeiro Rodney (PSD) e Gallo (Republicanos), além do secretário de Saúde de Taboão da Serra, José Alberto Tarifa, visitou o HPG e tiveram uma reunião com a diretora do hospital, Dra. Sandra Turati.
A reunião também foi acompanhada pelo deputado estadual Eduardo Nóbrega (Podemos) e do presidente da Câmara de Itapecerica da Serra, Ronaldo Cepacol (PSDB).
Em vídeo publicado em suas redes sociais, Eduardo Nóbrega se juntou a outros vereadores e reforçou a crítica, como não sendo “pessoal”.
Nosso objetivo é simples, não temos nada pessoal contra ninguém. Não queremos atacar por atacar. O que nós queremos é devolver o HGP do povo de Taboão da Serra e Embu das Artes.
Durante a apuração para esta reportagem, tentamos entrar em contato com a Prefeitura de Taboão da Serra para obter informações sobre as ações tomadas em resposta à redução no número de leitos do SUS na cidade ao longo dos últimos quatro anos.
Além disso, buscamos esclarecimentos sobre a existência de um plano para expandir as unidades de saúde, a presença de monitoramento para avaliar e aprimorar o sistema de saúde, bem como as medidas adotadas para prevenir eventuais negligências médicas.
Até fechamento dessa matéria, não recebemos qualquer resposta da Prefeitura em relação a essas questões. O convite continua aberto.
Saiba mais
Para obter informações mais detalhadas sobre a infraestrutura de saúde em Taboão da Serra e a evolução dos leitos do SUS, é possível consultar os dados fornecidos pela Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo via LAI e pela Fundação SEADE. Os dados são públicos.